domingo, 15 de fevereiro de 2009

Navegar é (im) preciso


Atravessei a porta da sala inundada. De quantos sentimentos retesados no ar é feita a poesia? Nem falar, nem escrever iriam diminuir por menor que fosse essa enchente. A Dom Luís estava clara e eu na penumbra. Passei na Bibi comprei um bolo grande salpicado de bolinhas de chocolate, umas bem pretinhas, outras bem branquinhas. Fazem croque-croque na boca. Fui parar mais longe. A roda-gigante do Parque Santo Estevão em Quixadá, a pipoca fazendo eco, o medo das alturas aninhado na mão do primeiro amor. A memória tem trilha sonora. Eu sou uma Dj de lembranças mixadas no presente. “Receba as flores que te dou e em cada flor um beijo meu....” – Deseja mais alguma coisa minha senhora? - Oh coragem dessa mulher! - Quer que eu diga mesmo? A gente não tem sossego. - Ei moça, bota uma empadinha de camarão. Pra’ comer aqui. Melhor assim. Estava tonta de coisas sem cara, sem nome, sem nenhuma posologia do modo de sentir. Acredito que sou boa para definir sentimentos. Camarão é bom demais. O resto eu não sabia. Nem sequer me pertenciam. Permaneci navegando no “Transatlântico” sem navio, sem bóia, sem salva-vidas, sem timoneiro. Deslizando fortalezas. Eu não imaginava de que matéria era feita aquela alegria tão vasta de um além mim. Líquida é que não devia ser. Gasosa. Dessa matéria que deixa a gente flutuando com os pés no chão. Navegar é preciso e eu aposto nos náufragos. De um estado qualquer das palavras. Diluídas, para abrandar as dores no “Chá de Abu”. As palavras, Fernanda, são cousas que nos carregam que nem submarinos? O jardim de Anna Karine é feito de palavras-hera, alastraram-se em meus muros e eu vou buscar outras mudas. As bolinhas de chocolate caem bem nessa manhã de domingo. O sol deixa a paisagem de todas as cores. Minhas linhas içam pipas em novas direções. Elas cruzam com tantas outras no céu de fortaleza. Aqui, me reconheço. Fragmentos saem da gaveta e eu já nem me sinto tão erma. Tenho sentimentos de gratidão em doses altas.

Fayga, Danni e Laura vocês entoam mar adentro as “palavras de pórtico” de Fernando Pessoa:

“Navegar é preciso, viver não é preciso. Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para casar com o que sou: viver não é necessário; o que é necessário é criar”

Terra a vista!

13 comentários:

  1. ai como foi lindo ler isso. vi as meninas, o pipoqueiro, a bibi, o domingo, teu domingo. meu domingo se transforma a cada texto bonito.
    que bom me ver nele. ver as meninas nele.
    as coisas bonitas tuas.
    adorei o abraço.
    um beijo. foi bom demais te ver.

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  2. qualquer coisa segurando a mão do bem amado é fácil de encarar...
    bjs

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  3. E nesse mar de palavras bonitas, acabamos encontrando outros 'náufragos' que nos salvam com suas poesias.

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  4. O cotidiano, nos pequenos gestos, nos remotam a memorias eternas. Um abraco!

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  5. Navegar é preciso. Mas que conheçamos antes a terra, para sentir saudades. Para um dia voltar. Para não perder o rumo. Nunca.

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  6. Adorei o texto! De verdade! Parabens! Veja o meu blog tambem www.cordelirando.blogspot.com
    bj
    Salete Maria

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  7. Pense que eu queria ter estado lá tb. Fiquei com as bolinhas de chocolate dando água na boca. Bjs.

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  8. Moça,
    Vim agradecer as palavras bonitas e doces ao meu respeito, feitas no blog do Franzé, Fico muito feliz por causar esse mixer de emoções nos leitores!
    Seu canto é maravilhoso, seus textos são mui belos!!
    Lambidas da lobba!!!

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  9. Obrigada por me visitar e me trazer até aqui.

    Um texto com muitos pensamentos, fluência do sentir.

    Escreve com muito sentimento e poesia.

    "A memória tem trilha sonora. Eu sou uma Dj de lembranças mixadas no presente"

    Gostei do todo, mas esse trecho me chamou a atenção.

    abraços

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  10. Como sempre seus textos são uma dose de ânimo pra gente, dar vontade de viver e sentir tudo isso. Você é puro sentimento e encanta cada leitor que fica sempre esperando a próxima. E ai quando vai ser?
    enorme beijo

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  11. " A memória tem trilha sonora." Palavras milimetricamente escolhidas. Uma prosa poética de arrancar suspiros.
    Sensibilidade pura.
    Beijos

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  12. Belas palavras. Me encantei e me identifiquei principalmente com o final. É preciso criar! Você cria, e com toda a sensíbilidade que lhe é peculiar. Fernando Pessoa estava certo, como tu também está, mas o certo, como o errado pode ter suas várias formas de ser.

    Abraço,

    R.Vinicius

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