(pintura de Hélio Rola)
Não há vestígio do teu nome na Linha. Ontem, o galo cantou
bem mais que três vezes e ele ignora que você aqui ficou. Os seixos da pequena
estrada não mais sabem da tua passagem. As papoulas das cercas vivas já
nasceram e morreram sem te mirar por mais de mil vezes. Estranho um amor tão bom
não deixar rastros. Entre meus dedos, continua a escoar esse líquido informe
que somos nós dois. E ao futuro apetece brincar de esconde-esconde.
Da ponta do deck, a vista alcança Canindé e lá não há
promessa em nosso nome. Se assim fosse, haveria entre braços, pescoço, dedos um
ex-voto de coração partido. Redenção fica à beira da estrada e ainda nos falta
cometer aquele grande pecado. Lembra? Você me contou a conversa que teve com
uma nossa senhora, aquela que te falou para ganhar o mundo. Pode ser essa a
matéria do que somos feitos, a distância.
Passa da meia-noite. Ao longe, tuas mãos talvez toquem um
instrumento inaudível. Aqui, um grilo brinca de revelar o escuro. Até que te
reencontre haverá entre nós um Paraná, o Ceará e um istmo de medo. Contudo, existe sempre um mas. São eles o
néctar do improvável, da arriscada aventura. Mas, tua pele é tão macia e tua
boca serena quando soletra meu nome. Mas, ao teu lado minhas mãos despertam em
alta temperatura. Mas, meu corpo sempre soube de ti.
Abeira-se a madrugada e a TIM não diz se persistimos. Há
linha? O amor é refém das operadoras. Melhor apagar a luz. Já nem é tarde. O
grilo, ironicamente, pousa no criado
mudo. O galo perde a noção das horas e ainda canta. Um avião corta o céu, tão
só, tão só. Somos isso meu amor, um motor
suspenso até que seja dado o alívio do comando: autorizada a aterrisagem?
Linha da Serra, 2-3 de maio de 2015.