
Acordou aos pulos. Era escuro breu. Sentiu um formigamento na ponta dos pés. Um frenesi de não poder parar braços e pernas. Tinha pressentimentos de fertilidades. Abriu os olhos e se perguntou em que diabo de lugar estava metida. Um silêncio zunia o vazio da escuta. Nunca se sabe do que vem depois de quando o nada se instaura. Raquel estava adiada de experimentar o ponto escuro do prazer. Nessa noite, fora tomada de assalto. Uma mão quente abria uma fenda e pedia passagem. Um silêncio de homem feito fera, movido da vontade dispersada de palavras, se apoderou do corpo dela. Sem se apresentar, sem pedir a chave, ele burlou segredos. Encontrou-a no canto esquerdo da cama. Raquel quase sempre se manteve a beira, no limiar entre um dentro e um fora. No parapeito do tanque com cheiro de barro e vislumbres de rã, na ante-sala das maldades infantis, na reserva do time de handball. Era a borda, seu lugar de ficar, o canto de conter precipitações. É certo que, quase sempre, era alvo de comentários. Ler muito provoca lentidões. Ela gosta de botar o corpo fora. Será que sente o suficiente? Sua velocidade cerzia um jeito de se retirar. Nessa noite, uma ligeireza cobriu o rosto dela. O visitante levou as mãos até a altura de suas fechaduras. Movendo um jeito de ter prazer. Ela sentou-se e, subitamente, sentiu-se empurrada de volta. A tela escura permitia ver a nitidez das dobras. Dos músculos pendendo braços e pernas. Da boca derramada em saliva e palavras sem nexo. Em dueto. Do roçar da barba mal-feita, fazendo arrepiar cada palmo da pele dela. Um grito pode esperar calado um incalculável tempo para ser rompido. Soou a sirene dos que se derramam. Finalmente, Raquel reconheceu o lugar onde havia dormido. No centro da paisagem do desconhecido. O homem.