Gustav Klimt
Não é fácil contar uma estória dessas não. Tem gente falando que é para ir direto ao ponto. Que ponto? Esse é um pecado que nem o escapulário do meu santo protetor deu jeito. Sou nascido no dia de São Expedito, aquele das causas difíceis. Minha mãe diz que sou guardado por ele. Para mim o ponto começou na rajada de vento, daquele final de tarde. Precisava ter avistado aquela mulher tão nua? Precisava ter deixado meu olhar ficar tão junto do dela? Tem fogo ali dentro, com cheiro de tentação e um anúncio escrito: gostosa! Eu me vi nu no espelho dos olhos dela. Feito retrovisor no banco detrás. Isso fica bonito para um refrão de forró. Pode ser cantado assim:
Será paixão esse desassossego. Que me tira do sério. Me deixa em desespero.Eu me vi nu no espelho dos olhos dela....
Naquela manhã, na frente da porta de Dona Raquel, eu pensei - Falcão, larga disso, tu é um homem direito. A piora de tudo é que o mestre de obras é meu sogro. Namoro a filha a mais de três anos e sou como ele mesmo diz – seu braço direito. Posso botar tudo a perder, basta minha mão mover um pedaçinho que seja daquela porta. Voltei ao ponto esperado. A porta, cancela da minha fome por ela, já não empata nada. Soltei a marreta, plantei-me bem na frente e falei – Dona Raquel - umas três vezes, desenfreado. Sem pensar, muito menos esperar resposta agarrei a maçaneta e fiz o movimento. Calculei uma palma da mão de abertura. Foi o que precisava, e vi. Deitada na cama de massagem, com uma calçinha branca, os seios posicionados na minha direção, banhados de óleo, redondos e firmes que nem holofotes na escuridão. Cada um cabe na palma da minha mão. Eu cresço. Seu corpo é um terreno a espera da obra. Eu sou o homem que faz. Vou levantá-la pegando cada uma de suas pernas, até a boca ficar rente a minha e depois a escancho no meu colo. Encaixados. Agora, não vejo mais nada, apenas a porta preparando a entrada. Finalmente, sinto esse pedaço de madeira deslizar nos trilhos. Não existem mais barreiras. Muito, muito gostosa! Eu páro. Logo, ela grita – Falcão, fecha essa porta! Sabe o meu nome – ela me quer. Nem tentou se cobrir, pelo contrário, virou o rosto na minha direção e gritou – tá doido homem?! Bem mais que isso, louco e cego de vontade. Se não fosse aquela mulher, ali no quarto. Se não fosse o medo que tive de mim mesmo e o susto dela ao me enxergar para além das paredes, caibros, tijolos, cimentos, portas e fechaduras eu derramava o meu óleo por dentro de seus cantos escuros. Com os dedos da minha mão, calejada de desejo eu a seguraria para que ela me deixasse passar e ficar ali dentro. O resto do meu corpo ia escorrer que nem tinta e marcar a pele daquela fêmea para ela nunca esquecer. A melhor massagem de sua vida. Esquecia era nunca! Essas mulheres bacanas sabem lá o que é homem de verdade.
Ela se levanta, olha nos meus olhos, agarra minhas mãos e fecha a porta. Sua respiração é tão desenfreada quanto a minha e os seus seios apontam o rumo do nosso desejo. Não tenho mais nada a dizer. A verdade de um homem tem quase sempre desavença com a verdade de uma mulher. Dou passagem para que ela fale. Eu já disse a minha história. È bom que ela confesse o que se deu entre nós dois. Nem que seja apenas no quarto trancado dessa carta secreta. Vou ser despedido mesmo, pouco importa. Que ela fale do antes, daqueles minutos de tempo que entraram feito marreta em todos meus alicerces. Apenas eu e ela. Duvido que ela vá direto ao ponto, de como deixou crescer meu desatino em direção incerta. Desde o vento. Em cada reparo, retoque, necessidade de prego, de gesso, uma telha a mais, um rodapé; cada feito tem o olho dela no meio, em busca do meu. Você nega?